Editorial
Uma palavrinha para as/os novas/os leitoras/es da Omenana
A palavra Omenana vem da língua Igbo e significa “cultura”. Ela também dá nome a esse periódico eletrônico que publica ficção especulativa de autorias africanas ou de afrodescentes em diáspora. A revista surgiu em 2014, e é publicada em edições quadrimestrais. A língua oficial da revista é o inglês, com alguns contos tendo sido editados e publicados em francês. Porém, os contos eram inéditos em português, principalmente o português brasileiro.
Por esse motivo, depois que conheci Chinelo Onwualu e Mazi Nwonwu, ao assistir a participação dela e dele em festivais literários tais como a FutureCon e o Festival Relampeio (ambos podem ser encontrados nos seus respectivos canais do Youtube), fiquei sabendo da existência da revista e comecei a ler as histórias publicadas nela, descobrindo novas autorias de quem eu nunca tinha ouvido falar antes, e aprendendo sobre questões de cultura e imaginação bastante diferentes, ainda que com muitos pontos de contato com narrativas brasileiras. Porém, a maioria dos contos estando em inglês, era mais difícil partilhar com um público que não tinha muita proficiência na língua, o que, infelizmente, inclui muitas pessoas no Brasil. E eu gostaria muito de partilhar essa descoberta.
Essa oportunidade se apresentou depois que tive a chance de convidar a Chinelo Onwualu, que já não era mais editora da revista, para conversar com meus/minhas estudantes. Conversei sobre a ideia que tive de traduzir alguma história para o português e ela me apresentou para a editora atual, Iquo DianaAbasi. Minha intenção era perguntar se poderíamos escolher alguns contos da Omenana para traduzir. Eu tinha recém criado um grupo de estudos e oficinas de tradução, que é algo que os cursos de Letras aqui, na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, mais voltados para a licenciatura, não abarcam. Ela sugeriu a ideia de publicar os contos na própria Omenana, com uma edição especial, a primeira, em português brasileiro. Foi uma imensa alegria.
Então, convidei mais alunas/os que estivessem interessadas/os e pessoas de outras universidades do Brasil, como a Universidade Federal de Alagoas e Universidade Federal de Santa Maria se juntaram a nós. Tivemos reuniões virtuais e cada um/a selecionou uma narrativa para trabalhar. Esse processo demandou a leitura de várias histórias, para escolher uma na qual iríamos efetuar o trabalho tradutório. Depois dessa primeira seleção, tínhamos cerca de 15 narrativas e estávamos ansiosas/os para começar. Entretanto, esse número ficou um pouco acima do combinado previamente. Isso daria o dobro do trabalho para a editora conseguir as permissões para publicar a história novamente, além de extrapolar um pouco da quantidade de contos que é tradicionalmente publicado em cada edição da revista. Conversamos e decidimos nos organizar em pares, e cada dupla iria traduzir uma narrativa. Essa não é uma maneira tão convencional de tradução, que tende a ser um trabalho mais individual, mas enquanto aprendizes, isso daria às/aos estudantes uma oportunidade de impulsionar os diálogos e colaborar mais ainda. Usamos diferentes estratégias: alguns traduziram metade-metade, adequando depois para não haver inconsistências dentro de um mesmo texto, outros dividiram em uma pessoa traduzia, a outra editava. E houve alguns desistentes no caminho. Por isso, terá um conto com apenas um tradutor. Mas não paramos aí. Todo mundo que estava envolvido no processo leu alguma das histórias das outras pessoas, fazendo sugestões de revisão e de conteúdo, mesmo de opções tradutórias. Somente depois desse passo é que consideramos as histórias prontas para serem publicadas. Além disso, a universidade aceitou e cadastrou nosso projeto como um projeto de extensão, uma forma de partilhar os conhecimentos produzidos dentro da universidade com um público maior. Isso permitiu que as/os estudantes recebessem horas de extensão, necessárias para seu processo de graduação.
Em suma, a experiência foi mágica para a gente. Fomos capazes de aprender mais sobre a cultura e literatura africanas e conhecer novas autorias. Criamos uma comunidade de pessoas interessadas em tradução e colaboramos com as pessoas sensacionais que fazem a Omenana acontecer e seguir forte. Agora, finalmente podemos compartilhar com nossos/as amigos/as e familiares os prazeres de se estar tão admiradas/os, assustadas/os, desconfortáveis, felizes, confusas/os, reflexivas/os quanto ficamos com essas narrativas. No Brasil, temos uma lei que incentiva o ensino da cultura e da história africanas. Alguns/mas pesquisadores/as nos mostram que essa lei não tem sido cumprida, e o inglês não é a disciplina onde isso geralmente acontece porque temos tão poucas horas do currículo obrigatório. Então, estamos lutando contra esse silenciamento e a Omenana pode nos ajudar, de fato, tornando-se acessível para um novo público e talvez encorajando mais pessoas a traduzir e conhecer mais sobre essas autorias e histórias. Boas leituras!
Elton Luiz Aliandro Furlanetto
Nesta edição:
A sala dos escritores | Chao C. Shete
Entre Jacintos | Mandisi Nkomo
Fluindo por Dentro | Lauren Beukes
Memórias Roubadas | Mwanabibi Sikao
Os Desconhecidos | Nana Afadua Ofori-Atta
Sapatos Favoritos | Gerald Dean Rice
An Explanation for the regular Omenana Reader
On this issue of Omenana, you are going to find some stories you have probably already read. This is because this special issue brings previously published African speculative short stories that were translated into Brazilian Portuguese.
It all started after I got to know Chinelo Onwualu and Mazi Nwonwu, by watching their participation in online festivals like FutureCon and Festival Relampeio. They were the ones that told me about Omenana magazine, so I started reading it and learning a lot about African culture and imagination. However, because most of the stories are in English, it was more difficult for me to share them with people in Brazil. However, this was what I was craving to do.
The opportunity presented itself after I had a chance of inviting Chinelo to have a talk with my students. I told her I had this idea of translating some of the stories into Portuguese, and she introduced me to Iquo DianaAbasi, who is currently editing Omenana. My intention was to ask her if we could select some stories and translate them. I had recently created a study group and translation workshop with some interested students of Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, where I am currently teaching. She liked the idea and suggested we could publish the translations as a special issue, the very first one in Portuguese, of Omenana. We were thrilled!
So, I invited more students who might be interested, and some people from other universities in Brazil joined us: Universidade Federal de Alagoas and Universidade Federal de Santa Maria. We had some virtual meetings and each one selected a story to work on. That demanded some reading of several stories until we could find the ones we enjoyed best. After this first selection, we came up with 15 stories we were eager to translate. However, it was a little more than what Iquo and I had anticipated. She would have double the trouble of asking everybody’s permissions, and the issue would have to bring some more stories than usual. So we talked and I decided we would pair up and each team of two would translate one story. This is not the conventional way of translating, generally a more individual task, but as learners of the craft, this would provide them with an opportunity to boost dialogs and collaborate even more. We used different strategies: translating half a story each, then adjusting for any possible inconsistencies, one translating and the other editing, and we had some dropouts. This is why one story had only one translator. And we did not stop there. We had everyone involved in the project reading and making suggestions on everyone else’s stories. It was only after this step that we considered the translations ready to be published. Also, the university accepted our project as an extension project, a means of sharing whatever knowledge we produce in the university with a larger audience. This rewarded the students for their dedication to the project, with extension hours they require for graduation.
All in all, the experience was magical to us. We were able to learn so much about African culture, storytelling and get to know new authors. We were able to create a community of people interested in translation and we collaborated with these amazing people who make Omenana strong and keep it going. Now we can finally share with our friends and families the pleasures of being as in awe, frightened, uneasy, happy, puzzled and reflexive as we were with these stories. In Brazil, we have a law regarding the teaching of African culture and history. Some scholars show that this has been a very difficult law to enforce, and English is not generally the discipline to do it, because it has so few hours in the mandatory syllabus. We barely have literature in public English education. So, we are fighting against this silence and Omenana can definitely help us toward making itself accessible for a new audience and maybe encouraging more people to translate and know more about these authors and stories.
Elton Luiz Aliandro Furlanetto